segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

Preso não pode ser obrigado a depor por videoconferência por deficiência da Susepe

Gabriela Barcellos

De acordo com decisão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, um preso não pode ser obrigado a prestar depoimento por videoconferência contra sua vontade por falta de transporte ou escolta.
A decisão é da 2ª Câmara Criminal, em análise de um mandado de segurança impetrado pela defesa de um homem preso preventivamente em Canoas. Com a decisão, que foi unanime, o homem conseguiu o direito de ser ouvido presencialmente, em interrogatório conduzido da 1ª Vara Criminal daquele município.
Os desembargadores entenderam que a falta de transporte ou escolta para que o réu seja levado da casa prisional até o fórum não é justificativa plausível para designação de audiência por meio de videoconferência porque esta hipótese não está prevista em nenhum dos incisos do artigo 185, parágrafo 2º, do Código de Processo Penal, que regula o uso do recurso nos interrogatórios.
Caso específico
No caso do julgamento, o juízo local designou a oitiva do preso pelo sistema de videoconferência considerando as deficiências estruturais da Superintendência de Serviços Penitenciários (Susepe), que não permitiram o deslocamento dele até a vara — falta de efetivo para fazer a escolta e até de energia elétrica.
No recurso, o réu argumentou que a audiência por videoconferência é ‘ato processual excepcionalíssimo’, sem previsão de obrigatoriedade no CPP, ressaltando que seu direito será desrespeitado se a solenidade for feita nos moldes decidido pela juíza responsável pela vara, já que se constitui em grave violação também dos direitos humanos.
Decisão
Inicialmente, o relator do mandado de segurança, desembargador Luiz Mello Guimarães, indeferiu a liminar, inicialmente, por não ver nenhum prejuízo ao réu e reconhecer não só a legitimidade do interrogatório nesse formato, mas também considerando a celeridade processual, já que a corte vem se esforçando em favor das oitivas por videoconferência, em razão da deficiência de pessoal e de verba para escoltas por parte da Susepe.
Na análise do mérito, porém, ele chegou a conclusão diferente visto que o artigo 185, parágrafo 2º, do CPP, elenca, de forma taxativa, as hipóteses em que o réu pode ser interrogado por meio de videoconferência. E ‘‘deficiências de escolta’’ não se insere em nenhuma delas. Apontou ainda que o interrogatório por videoconferência é o último recurso (ultima ratio), só adotado quando comprovadamente inviabilizada a presença física do réu à audiência que fará o interrogatório.
O relator ressaltou, por outro lado, que nem foi cogitada a possibilidade de promover o ato, pessoalmente, no presídio onde o réu se encontra. Com isso, as garantias e direitos fundamentais expressamente assegurados na Constituição, dentre os quais o devido processo legal, acabaram sendo sacrificados sem justificativa idônea, visando única e exclusivamente a suprir de falhas orçamentárias e organizacionais do Poder Executivo’’ — no caso da Susepe.
Para finalizar, destacou que o Pleno do Supremo Tribunal Federal, antes da edição da Lei da Videoconferência (11.900/2009), reconheceu a inconstitucionalidade de leis estaduais que previam a possibilidade de interrogatórios por esse sistema eletrônico-virtual. ‘‘Portanto, não há como uma campanha em prol da celeridade e desburocratização dos processos alcançar o ato de interrogatório, sobrepondo-se a uma Lei Federal ao justificar nova hipótese autorizadora de videoconferência’’, definiu no voto.

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